Augusto Mateus

 

“O Setor dos Resíduos e a Economia Circular: um roadmap” foi o tema de uma sessão para a apresentação do estudo sobre a relevância e o impacto do setor dos resíduos na perspetiva de uma economia circular.

O estudo, comissionado pela associação Smart Waste Portugal, foi apresentado ontem, 10 de julho, no Auditório da Abreu Advogados, em Lisboa.


A Economia Circular é um conceito estratégico que assenta na redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia. Das principais conclusões/recomendações do Estudo, destacam-se:

  • A falta de robustez das estatísticas dos dados e a sua monitorização;
  • A dificuldade em aceder a mecanismos de incentivo e financiamento por parte das empresas;
  • A falta de capacitação e comunicação e a necessidade de haver formação avançada que inclua as temáticas da economia circular;
  • A falta de investimento na I&D e inovação e uma ligação à indústria 4.0;
  • A necessidade de simplificação da legislação relacionada com a desclassificação de resíduos para subproduto;
  • Uma maior promoção e foco em agendas regionais e setoriais;
  • A necessidade de uma estratégia colaborativa, envolvendo todos os stakeholders.

Anna Lehmann

É por isso necessário, diz Augusto Mateus, da Augusto Mateus & Associados, que elaborou o estudo, agir para corrigir essas falhas. Algo que deve ser realizado pelos intervenientes das indústrias, órgãos do governo e entidades relacionadas com a gestão de resíduos: “Só é possível ter sucesso em conjunto e revolucionando, de alguma maneira, a forma como geramos riqueza, gerimos cidades, organizamos a relação entre o mundo urbano e o mundo rural e articulamos os mercados em que os destinatários finais são empresas e os mercados em que os destinatários finais são as pessoas e as suas famílias”.

“O que é preciso é uma base de trabalho que possa ser prosseguida em direção a um conjunto de aspetos que institucionalizam verdadeiramente a circularidade da economia e promovem a transformação do fim para o princípio, do resíduo para o recurso” Augusto Mateus, sócio fundador da Augusto Mateus & Associados
 
Ana Lehmann, Secretária de Estado da Indústria, falou acerca do conceito da economia circular e recordou as palavras de David Attenborough, que já alertou para a possibilidade de podermos estar a testemunhar a sexta extinção em massa no planeta Terra. Ana Lehmann recorda que estamos todos tão empenhados na Indústria 4.0, mas que não nos podemos esquecer de que não existirá uma Terra 2.0.
 
“A transição para a economia circular é uma urgência, no sentido de uma necessidade e de uma inevitabilidade” Ana Lehmann, Secretária de Estado da Indústria
 
Recordou ainda que de todos os resíduos produzidos a nível mundial apenas 25% são recuperados e reintroduzidos no circuito produtivo. Há ainda muito para fazer, apesar de Portugal ser dos países que mais se tem destacado na Europa, no cumprimento de metas.
 
Sumario Executivo
 

Os setores prioritários

 
Os setores identificados como prioritários, cruzando o potencial de circularidade e económico, são a construção, a metalúrgica de base de produtos metálicos, o comércio e serviços, as indústrias extrativas, as indústrias alimentares, as indústrias da moda, as indústrias químicas, farmacêuticas, da borracha e dos plásticos.
 
Os setores estiveram representados num debate, moderado por Fernando Leite, da Lipor, que decorreu com a presença de empresas como a Amorim Cork Composites, a AVE – Gestão Ambiental e Valorização Energética, a Ernesto São Simão, o Grupo Elevo / Plataforma Tecnológica Portuguesa da Construção e a Sonae MC.  
 
Mesa Redonda

“Ainda antes de se falar na economia circular, no início da questão da temática da sustentabilidade, começámos a tomar algumas ações com o intuito de minimizar o impacto da utilização dos plásticos no meio ambiente. Hoje a Ernesto São Simão utiliza cerca de 50% de materiais reciclados e eu diria que se não tivéssemos este modelo de negócio, se calhar não estaríamos cá hoje”, explica Pedro Simão, diretor geral e neto do fundador da empresa Ernesto São Simão. Tendo como fator competitivo a utilização de materiais reciclados, a empresa vai mais além e foca-se no design para desenvolver produtos que promovam a circularidade, nomeadamente na produção de polipropileno a partir do próprio polipropileno, devido à existência de material suficiente que pode ser reaproveitado, e no desenvolvimento de bioplásticos.

“A Amorim Cork Composites nasceu há 55 anos para dar resposta a uma oportunidade de negócio que era adicionar valor aos resíduos que vinham da produção das rolhas. Toda a segmentação da empresa tem sido feita de uma forma muito natural em torno da economia circular e hoje trabalhamos para uma panóplia muito grande de aplicações que vão desde a indústria aeroespacial, das juntas e vedantes, a naval, a automóvel… produzimos essencialmente materiais técnicos, de performance, que a maior parte das pessoas não associa à cortiça…, mas que existem!”, explica Eduardo Soares, diretor de Inovação da Amorim Cork Composites.
 
“Temos que ter menos embalagem, mas melhor embalagem. Hoje em dia, fazemos uma procura exaustiva de materiais alternativos e apostamos na reciclagem e compostagem”. Pedro Lago, diretor de projetos da Sonae MC
 
Pedro Lago, diretor de projetos da Sonae MC, falou acerca da aplicação da economia circular no retalho, nomeadamente no que concerne aos produtos alimentares, exemplificando algumas medidas para reaproveitamento de produtos, a que não gosta de chamar de resíduos. É o caso do Panana, um pão lançado no Continente, produzido a partir de bananas que já não se encontram em condições para vender no linear das frutas e que representam o produto n.º 1 quando se fala de quebras. “Também temos que ter cuidados com os consumíveis – plásticos e cartões – que são muito utilizados no setor do retalho”, diz o executivo. Sobre a tendência do crescimento das vendas a granel, para minimizar o recurso à embalagem de produtos, Pedro Lago explica: “Com toda a franqueza, a venda a granel não é a única solução, porque as embalagens trazem funcionalidades e comodidades que não estamos preparados para abdicar. Em paralelo com o crescimento da venda a granel, o que estamos a fazer é trabalhar nos materiais das embalagens”.
 

A responsabilidade é de cada um de nós

Carlos Martins, Secretário de Estado do Ambiente, fez a conclusão da sessão a relembrar “o papel dos 10 milhões de portugueses, em tudo isto, e a mudança de paradigma que só irá ocorrer se conseguirmos mudar os comportamentos”. Relembra que todos somos consumidores e que a forma como nos descartamos dos produtos, que já não necessitamos, é fulcral para o sucesso da economia circular. Comentou os resultados de um estudo acerca da efetividade de uma campanha realizada para promover a poupança da água, em que 88% dos inquiridos referiu que a água é um recurso muito importante e deve ser corretamente gerido, mas 66% não faz nada para a poupar.
 
“Estamos ainda muito longe de que os valores, que já foram transmitidos nestes 20 anos que passaram, se transformem em comportamentos. Eu diria que o esforço de comunicação que irá ser desenvolvido deverá estar mais centrado na mudança comportamental do que em evidenciar o valor ambiental dos resíduos” Carlos Martins, Secretário de Estado do Ambiente
 

A importância do setor dos resíduos


Em 2016, o setor dos resíduos em Portugal era formado por 2542 entidades, que empregavam cerca de 25 mil trabalhadores e faturaram quase 2,5 mil milhões de euros. O setor dos resíduos nacional gerou um valor acrescentado de 718 milhões de euros. No que se refere aos efeitos indiretos e induzidos (corrigido o efeito de substituição promovido pela introdução de subprodutos na economia), estima-se que a atividade do setor dos resíduos tenha gerado, em 2016, uma produção adicional na economia portuguesa de cerca de 3,6 mil milhões de euros, refere o estudo.
 
Roadmap
 
A atualização do Estudo sobre a Relevância e o Impacto do Setor dos Resíduos em Portugal na Perspetiva de uma Economia Circular, realizado pela consultora Augusto Mateus & Associados e a produção da versão executiva bilingue foi patrocinado pelas seguintes entidades: OURO - LIPOR; PRATA – Ave, Biorumo, Sociedade Ponto Verde; BRONZE – Abreu & Associados, ACC, EGEO, Jerónimo Martins, Novo Verde, Ovo Solutions, Sonae, The Navigator Company, Renascimento, Tratolixo, Veolia. Apoios financeiros da Ernesto São Simão, Euro Separadora, Laboratório de Ensaio de Materiais de Construção e Sopinal.